23/08/2015

ARTIGO

Dez medidas de combate à corrupção

Por Fernando Rocha de Andrade - Procurador da República, Membro do MARCCO

Duzentos bilhões de reais! Essa é a cifra estimada pela ONU de recursos públicos desviados no Brasil por ano. É quase duas vezes o orçamento da saúde, e duas vezes e meio o orçamento com educação. A corrupção, simbolicamente tratada como uma prática criminosa, na verdade se tornou uma endemia na administração pública e, para muitos, verdadeiro meio de vida. Emblemática a fala de um dos advogados dos réus da Lava Jato, talvez por ato falho ou excesso de sinceridade, que afirmara que no Brasil nenhum paralelepípedo é colocado sem que haja propina. Enfim, a verdade é que a corrupção está estabelecida e arraigada no país, retirando a qualidade que se espera da educação, da saúde, segurança pública, a par de debochar do cidadão e desestimular o setor produtivo severamente achacado com a carga tributária.

Para não perder a toada pessimista, acrescento ainda que para o corrupto, esses desvios de recursos públicos estão valendo muito à pena no país da impunidade. Em um arroubo, a corrupção no Brasil é profundamente rentável e estimulante para quem a pratica, mercê da certeza da impunidade, especialmente traduzida na legislação ideologicamente produzida para punir delitos considerados violento e voltados contra bens jurídicos individuais. Historicamente o sistema penal brasileiro foi concebido para punir e investigar crimes violentos contra a vida e contra o patrimônio particular.

O patrimônio público, sob essa perspectiva, sempre foi posto em segundo plano. Para o legislador de 1940, somente interessa pôr atrás das grades aqueles que cometem delitos considerados violentos e praticados contra o patrimônio individual. E é o perfil de tais criminosos que lotam as penitenciárias do país. As infrações contra a administração pública foram pautadas como coadjuvantes dessa cruzada e seus autores são invariavelmente brindados com penas alternativas sem a devida e eficiente preocupação com a reparação integral do dano causado. Esse é o quadro atual e essa é uma das causas eficientes da corrupção no país. A campanha das 10 medidas de combate à corrupção visa exatamente modificar esse quadro de impunidade, tornando sua prática um comportamento altamente desinteressante e arriscado, para o corrupto. Dentre essas medidas, avultam a criminalização do enriquecimento ilícito, o aumento proporcional das penas dos crimes de corrupção, na medida do valor envolvido, a proibição de penas alternativas e a exigência de reparação integral do dano causado pela corrupção.

O corrupto poderá perder todo o seu patrimônio, como um dos efeitos da condenação, desde que fique provado que sua edificação se deu por consequência das práticas ímprobas ou não tenha causa lícita aparente. O escalonamento das penas nos crimes de corrupção permite torná-los hediondos ao atingir o aporte de 100 salários-mínimos e, alcançando 10 mil salários-mínimos, as penas podem variar de 12 a 25 anos de reclusão. Institui-se o teste de integridade do serviço público, método amplamente adotado nos EUA, Reino Unido, Austrália e Hong Kong, consistente na possibilidade do servidor público ser submetido concretamente a uma cilada criada pela administração para aferir se o agente é digno da função que exerce e em qual medida.

Estimula-se a celeridade no trâmite dos processos, racionaliza o sistema recursal e de nulidade, para evitar o abuso do direito de defesa que, sob o pretexto de resguardar o devido processo legal, somente se presta a garantir a impunidade do agente improbo. Por fim, além de extinguir a prescrição retroativa, permite-se a execução provisória das penas impostas, quando sua decisão somente for atacável mediante os recursos extraordinários nos quais não se pode mais discutir matéria de fato ou probatória, tornando mais eficiente o trâmite processual, além de valorizar a atividade das instâncias ordinárias do país. Nesse tempo de crise e indignação popular, cujas instituições da democracia são postas à prova, é momento ímpar da sociedade se organizar de forma articulada para combater um dos grandes males do país que é a corrupção e, concretamente, temos a oportunidade de aderir à campanha de 10 medidas de combate à corrupção, assinando a lista de apoiamento.

- Artigo publicado no jornal Tribuna do Norte, em 23/08/2015. Disponível em http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/dez-medidas-de-combate-a-corrupa-a-o/322448

Postado em 23/08/2015 às 21:00

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