15/06/2014

ARTIGO

Marinho Chagas: nome de R$ milhões!

Por Luciano Ramos - Procurador-Geral do MPC/RN

Os meus sonhos foram todos vendidos. Tão barato que eu nem acredito.
Meus heróis morreram de overdose. Meus inimigos estão no poder. Ideologia, eu quero uma pra viver.
(Cazuza, Ideologia)

Quando falamos de sonhos e buscas do ideal, Sociedade dos Poetas Mortos é um dos filmes mais marcantes. Ele remete à saudade daquilo que não existe mais e também nos chama a subir à mesa para olhar as coisas por outra perspectiva, em inesquecível cena.

E a ele recorro para equacionar a dualidade entre a justiça da homenagem a Marinho Chagas e a racionalidade das contas públicas, ambos caminhos necessários para a formação da sociedade que pretendemos ter.

A importância do célebre lateral esquerdo, sobretudo como símbolo, é inegável. Potiguar nascido pobre, Marinho destacou-se nacional e internacionalmente. Alcançou seu ápice na Copa do Mundo de 1974, quando foi titular da seleção brasileira e eleito o melhor jogador da sua posição entre todos os países que disputaram aquele mundial.

Em um país que convive com ídolos efêmeros, muitos mortos de overdose, ao ponto de jovens espelharem-se em traficantes de drogas, sempre haverá interesse público em não deixar morrer nomes como o de Marinho Chagas, pois cresceu com o seu talento e esforço pessoais, além de enfrentar os problemas das fraquezas humanas.

Mas, o dilema está na maneira que o Poder Público manterá esta história viva, com o risco de o impetuoso lateral esquerdo atropelar as contas públicas.

Inegavelmente, as concessões de estádio abraçaram a lógica e a ideologia do mercado. Assim, gravar o nome em pedra não é mais garantia de imortalidade - que o digam Machadão, Mário Filho e Otávio Mangabeira – e tem um custo alto.

Escolhemos construir o estádio via Parceria Público-Privada, com os seus efeitos colaterais próprios, pois o governo do Estado não pode desconsiderar o contrato e firmado – ressalvados questionamentos quanto a sua legalidade.

E o Plano de Negócios deste contrato administrativo prevê receitas necessárias a sua viabilização. Entre elas, a venda do naming rights – uma empresa compra o direito de associar seu nome a um evento ou instalação, e assim ganha publicidade, e alavanca seus produtos e serviços.

Quem acompanha futebol certamente já se deparou com nomes novos como Copa Bridgestone Libertadores - antes Santander -, Brasileirão Chevrolet ou Itaipava Arena Fonte Nova. Neste último negócio, o nome e a exclusividade de produtos foram vendidos à cervejaria pelo valor de R$ 100 milhões, a serem explorados por 10 anos.

E o que significaria uma negociação desta pela Arena das Dunas? A tomar por Salvador, R$ 50 milhões para os cofres públicos – 50% das receitas adicionais convertem-se em dinheiro público. Potencializá-las é o único meio de se fechar a impagável conta que todo mês retira R$ 10,3 milhões do orçamento público. De outro modo, não aguentaremos a longa maratona dos próximos 18 anos de execução do contrato.

Por este substancial detalhe, os impactos são diversos na fixação por lei do nome do estádio e do novo aeroporto – são PPP’s com regras diferentes. O aeroporto tem como principal fonte de receita a tarifa cobrada do usuário – passageiros e companhias aéreas – e a empresa privada pagou pela concessão.

Nesta, não houve transferência do direito de vender o nome da instalação nem há regra de partilhamento de receitas adicionais nos moldes da PPP da Arena das Dunas. Já a viabilidade econômica do estádio, e a consequente capacidade de pagamento estatal, pressupõem contraprestações mensais do Poder Público e divisão do lucro obtido entre os parceiros. Portanto, fixar o nome da Arena por lei pode ser um tiro no pé, com frustração total ou parcial de potenciais receitas públicas.

Não sairia mais barato criar um programa educacional com seu nome, eternizando-o nos ideias do esporte, cultura e conhecimento cultivados em crianças com poucas oportunidades? E que tal financiá-lo com a parte da venda do naming right da Arena das Dunas que toca ao Poder Público?

Certamente Marinho Chagas ficaria contente com este drible na dificuldade. Assim, o sonho não sairia tão caro nem o entregaríamos a preço vil.


Postado em 15/06/2014 às 21:00 - Artigo publicado originalmente na Tribuna do Norte 

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